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Remédio essencial para transplante de medula óssea será descontinuado no Brasil

Procedimento que usa o medicamento bussulfano é parte do tratamento de doenças ligadas ao sangue, como em casos de leucemia e linfoma; situação preocupa médicos e pacientes que dependem do fármaco

Em 2019, o Brasil realizou 3.805 transplantes de medula óssea (TMO) em adultos e 534 em crianças. Os dados são do Registro Brasileiro de Transplantes. A realização da maioria desses procedimentos não seria possível sem o bussulfano, medicamento responsável por “zerar” a medula doente e ajudar a preparar o organismo para receber uma saudável. O TMO é parte do tratamento de doenças ligadas ao sangue, como em alguns casos de leucemia e linfoma. No país, o laboratório responsável pela distribuição do medicamento é a Pierre Fabre, sob licenciamento da farmacêutica Otsuka. Através de um comunicado geral, no dia 2 de dezembro de 2020, o laboratório disse que “dentro dos próximos meses, a depender da demanda, o medicamento Busilvex – Bussulfano não estará mais disponibilizado no mercado em vista do fato da descontinuação do mesmo, no Brasil, pela Pierre Fabre”. Ainda de acordo com o documento, a “decisão decorreu do fato de que a antiga planta industrial devidamente aprovada pela Anvisa deixou de fabricar o produto em 31 de dezembro de 2018 e a Otsuka e a Pierre Fabre não conseguiram encontrar um fabricante alternativo adequado para o mercado brasileiro”.

A situação preocupa médicos e também pacientes que já precisaram do medicamento, como a escritora e atriz Duda Riedel. Ela foi diagnosticada com câncer em maio de 2019 e, em novembro do mesmo ano, realizou o transplante de medula óssea que possibilitou a sua cura. “Apesar de eu já ter feito o procedimento e esperar nunca mais precisar de novo, uma notícia como essa impacta a gente. Eu passei por isso, sei a dor e tormento que é passar por um TMO. Imagina você encontrar um doador e não poder fazer o procedimento porque falta medicação? A gente se sensibiliza”, disse em entrevista à Jovem Pan. Ela organiza uma petição online com o objetivo de reunir 200 mil assinaturas chamando a atenção para o desabastecimento do bussulfano. Até o fechamento desta  reportagem, pelo menos 158 mil pessoas já tinham assinado o documento. O assunto também chegou aos trending topics do Twitter com a tag SALVEM OS PACIENTES. “Temos o objetivo de fazer a sociedade entender o que está acontecendo. Precisamos de mobilização social, política, que o Ministério da Saúde e a Anvisa se posicionem. Queremos acesso a medicação em caráter de urgência. A falta de medicamento não é um problema de agora”, completou Duda Riedel.

O que é o bussulfano? 

Essencial na maioria dos protocolos de transplante de medula óssea alogênico, que é quando o individuo recebe células/órgão/tecidos de uma pessoa compatível, o bussulfano é um medicamento quimioterápico utilizado antes do procedimento. Ao contrário de um transplante de rim, por exemplo, onde é realizada uma cirurgia, o TMO é uma transfusão. “No caso de um rim, você tira o órgão de alguém e coloca na pessoa que não tem. No TMO você coleta a célula tronco hematopoiética do doador e faz uma infusão”, explica o médico hematologista do Serviço de TMO do Hospital Universitário da Universidade Federal de Juiz de Fora, Abrahão Elias Hallack Neto.

Para isso, é preciso preparar o corpo fazendo uma quimioterapia de condicionamento. De acordo com Hallack Neto, ela tem duas funções: criar o cenário para o transplante e, também, propiciar um “retratamento” da leucemia, que é a principal doença transplantada. Apesar de existirem medicamentos alternativos que cumprem a mesma função do bussulfano, essa é mais uma dificuldade no Brasil. “Esse é mais um em um grupo de medicamentos que já são difíceis de serem conseguidos. Seja pela falta dele no mercado ou porque não dispomos aqui, por não serem liberados pelos órgãos competentes como a Anvisa e os laboratórios”, explica o hematologista. Para o onco-hematologista, Breno Gusmão, o uso do bussulfano é fundamental nos transplantes de medula óssea.

“A sua importância vem pelos dados de eficácia comparados a outros medicamentos usados nesse cenário. [Com a descontinuidade], vamos retroceder na ciência e utilizar associações de medicamentos com menor eficácia e mais toxicidade”, explicou Gusmão, que é médico do Comitê Médico da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale) e da Beneficência Portuguesa de São Paulo.

É importante ressaltar que o medicamento é usado em todos os tipos assistência à saúde, tanto pública como suplementar.

E agora? 

A Sociedade Brasileira de Transplante de Medula Óssea (SBTMO) e a Sociedade Brasileira de Oncologia Pediátrica (Sobope) assinaram, nesta segunda-feira, 4, um artigo contestando os mais de 30 dias sem uma solução para o problema. De acordo com as associações, foi enviado um ofício à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e, pouco depois, também ao Ministério da Saúde, “no intuito de encontrar uma estratégia que pudesse evitar a falta do fármaco e em busca de uma pronta solução. Um ofício expedido pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS), foi enviado aos cuidados do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, reforçando a solicitação”. “Temos a esperança de que ambos, Ministério da Saúde e Anvisa, poderão impedir que haja desabastecimento deste fármaco. É nossa expectativa e temos nos empenhado para isso. Além de nós, a Associação Brasileira de Linfomas e Leucemias (Abrale) a Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular (ABHH) também têm procurado abrir diálogo com as esferas governamentais”, diz o comunicado. Nesta segunda, o deputado federal Capitão Wagner Souza (Pros-CE) solicitou ao Ministério da Saúde e à Anvisa um pedido de providência urgente no sentido da “adoção de todas as medidas para garantir o fornecimento do medicamento, seja mediante a importação pelo governo brasileiro ou autorização excepcional de uso de similares confiáveis, até que haja uma solução definitiva em defesa de todos os cidadãos que precisam realizar transplante de medula”.

Por meio de nota, a Pierre Fabre disse à Jovem Pan que é a distribuidora exclusiva do Busilvex (bussulfano) no Brasil, mas a licença pertence ao laboratório japonês Otsuka – que subcontrata a fabricação de um terceiro. “A possibilidade de interrupção do abastecimento surgiu de uma questão operacional, decorrente do encerramento da atividade de produção do medicamento no local de fabricação atualmente aprovado pela Anvisa”, diz o documento. A empresa ainda reforça que não interrompeu a distribuição e que o estoque total atende os pacientes brasileiros até junho de 2021. “Estamos trabalhando ativamente com a Otsuka para buscar uma nova opção de fornecimento de bussulfano ao mercado brasileiro”, completa. No dia 23 de dezembro, de acordo com a nota, foi solicitada uma reunião com Anvisa para discutir o tema e avaliar possíveis soluções.

Já a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) disse à Jovem Pan, por meio de nota, não possuir instrumento legal que impeça os laboratórios farmacêuticos de retirarem seus medicamentos do mercado. “Quanto ao caso do medicamento bussulfano, a descontinuidade do fornecimento não está vinculada a nenhum pedido pendente junto à Anvisa, uma vez que houve comunicação de descontinuação por parte da empresa detentora do registro do medicamento na Anvisa devido ao encerramento da licença comercial do produto à Pierre Fabre”, informou. De acordo com a Agência, a solicitação de importação em caráter excepcional foi autorizada pela Anvisa para evitar o desabastecimento. Contudo, por questões comerciais, a transação não foi possível. Procurado, o Ministério da Saúde ainda não se manifestou.

 

Fonte: Jovem Pan – Camila Corsini

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